Parábola acerca da providência

        Não sei se vocês sabem hoje o que é um lampião belga. No meu tempo de menino, eram comuns no interior. Chamavam belga a um lampião grande, de querosene, geralmente suspenso na sala de jantar. Davam muito boa luz. Era ao pé dele que se conversava, costurava-se, trabalhava-se, lia-se à noite nas cidadezinhas ainda não providas de eletricidade. E como vocês devem ter percebido, havia um deles em casa de dona Leonor a cuja luz ouvíamos dona Lina.
        Pois bem, ao chegarmos a sala estava às escuras. O sr. Antônio quebrara o vidro do lampião ao acendê-lo; e agora tinha ido comprar outro no armazém do largo; devíamos esperar. Não demorou muito e voltou com um vidro novo, a manga como se chamava. Logo que o lampião brilhou no alto do teto, dona Lina contou-nos o seguinte:
        —  Andando pelas campinas, duma aldeia para outra a pregar o Evangelho, Jesus era seguido por muita gente. De uma feita, ele se voltou para os que o seguiam e lhes disse:
        —  “Se alguém vem a mim e não aborrece a seu pai e mãe, a sua mulher e filhos, a seus irmãos e irmãs, e ainda a sua própria vida, não pode ser meu discípulo”.
        —  O que é isso, dona Lina! exclamamos. E o sr. Antônio ajuntou:
        —  Então para eu seguir a Jesus tenho de abandonar a Leonor e essa meninada aos pais? Você acha que isso está certo?
        Dona Lina riu gostosamente e explicou:
        —  Titio, os ensinos de Jesus foram muito mal compreendidos e continuam a sê-lo. Para seguir a Jesus, não precisamos nem devemos abandonar ou aborrecer nossos familiares, nem quem quer que seja. Pelo contrário, devemos amá-los ainda mais, para que sejamos dignos de Jesus, o qual fez do amor a sua lei suprema. O que Jesus quis dizer é que se alguém estiver interessado em ser seu discípulo, isto é, em praticar o Evangelho para conquistar um bom lugar na pátria espiritual, não deve deixar que as idéias contrárias de seus familiares o perturbem. Se seus entes queridos não quiserem segui-lo, o discípulo de Jesus seguirá à parte o seu caminho espiritual, sem deixar de tratar carinhosamente de toda sua família, pois ele é responsável por ela perante Deus.
        —  Ah, bom! Agora sim e estou de acordo com Jesus. Mas é difícil a alguém dedicar-se à Espiritualidade no meio de uma família que não o pode compreender.
        —  Realmente, titio, tal tarefa exige muita paciência, muita renúncia e muito bom exemplo. Pelos exemplos de bem viver é que podemos conquistar para Jesus os que nos cercam, os que convivem conosco. E Jesus ainda continua dizendo que qualquer um de nós, que não der de mão a tudo o que possui, não pode ser seu discípulo.
        Aqui dona Aninhas se retraiu um pouco na cadeira, pois ela era mais ou menos rica. Dona Lina percebeu e delicada-mente explicou:
        —  Esse é um outro ensinamento mal compreendido pelos homens. Jesus não quer uma humanidade de pobretões, ou que os que têm atirem fora o que possuem. Não é isso. Ele nos ensina que em quaisquer circunstâncias em que a vida nos colocar, devemos saber sacrificar nossos interesses materiais em benefício de nossos interesses espirituais. Tratar primeiro dos interesses de nosso espírito que é imortal; os interesses da matéria devem sempre ficar em segundo lugar. Compreenderam?
        —  Sim, senhora! respondemos e notei que dona Aninhas respirava como que mais aliviada, e sorria como se em seu cérebro bailasse uma idéia agradável.
        — Jesus compara seus discípulos ao sal. O bom sal salga e preserva da podridão. Assim o bom discípulo vive uma vida pura, dando sempre o bom exemplo para que todos se livrem do mal.
(O Evangelho da meninada. Cap. 70. Eliseu Rigonatti)

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