O peixinho bola branca

            Na Lagoa Grande viviam peixes coloridos de vários tipos, rãs, sapos e uma família de jacarés – a respeitável família de Jacaré Coroa. E todos se amavam.
            Em certa manhã, porém, saiu das profundezas da lagoa um peixe desconhecido, muito forte e mal encarado. Era a primeira vez que ele deixava a toca no meio do lodo. E foi subindo, subindo...E quanto mais subia mais as águas ficavam claras, o que o deixou intrigado. Ao chegar a superfície ficou tonto com as belezas que viu – o sol refletindo-se nas águas tranqüilas, o céu azul, as flores em volta da lagoa...
            “Que espetáculo!” – exclamou ele, arregalando os olhos. E viu passar um cardume de peixinhos prateados, brincando de soltar bolhas de ar.
            “Sim, senhor! Eu, vivendo no lodo, e eles aqui em cima, no meio de tantas maravilhas!”
            E, invejoso, mostrou os dentes.
            Os peixinhos prateados continuavam a brincar e, de repente, viram Dom Bagrão e fugiram, apavorados, gritando:
            - Que peixe é esse? De onde veio? O que quer?
            Dom Bagrão deu uma gargalhada.
            - Ah, ah, ah, ah! Estão com medo, hein? Eu me chamo Dom Bagrão! E sou o rei da lagoa! E não quero mais ver nem um peixinho brincando. A partir de hoje trabalharão para mim. Venham todos aqui!
            Os peixes aproximaram-se, devagarzinho e trêmulos; menos, Bola Branca, que fingiu não escutar.
            - Você, também! Venha aqui!
            Bola branca veio e Dom Bagrão acrescentou com sua voz forte e rouca:
            - Eu vivia no fundo da lagoa, mas, agora viverei entre vocês. Vamos, comecem já trabalhar para mim, trazendo alimentos escolhidos e gostosos....
            Os peixinhos obedeceram, ligeiros; menos Bola Branca, que, escondido, refletia, distante: “Nossa vida sempre foi alegre e cheia de paz....Agora, estamos todos em perigo...Com que direito Dom Bagrão nos quer escravizar? Ele é mau e devia continuar no lodo...Seu lugar é lá, e não aqui!”
            E, revoltado, Bola Branca acabou adormecendo. E teve um lindo sonho. Sonhou que estava ao lado de um espírito de muita luz; um peixe tão brilhante, que chegava a iluminar as águas da lagoa.
            - Quem é o senhor? Perguntou Bola Branca ao espírito.
            O peixe luminoso respondeu:
            - Sou o Espírito Guia que orienta a vida de todos os peixes da lagoa.
            - Quem é o senhor? Perguntou Bola Branca ao espírito.
            - Que bom! Disse Bola Branca. Então, eu meus irmão seremos salvos pelo senhor!
            - Salvos? Eu não vejo ninguém em perigo...
            - Dom Bagrão está nos escravizando! Explicou Bola Branca.
            O peixe luminoso sorriu, dizendo:
            - Não devem ter medo. Foi Deus, o Criador da Vida, quem permitiu que Dom Bagrão saísse do lodo e viesse morar com vocês.
            - Mas, Dom Bagrão é mau! Insistiu Bola Branca. E nós somos bons. Ele não pode viver ao nosso lado.
            _ Ele é mau, mas não tanto....Por isto, meu filho, deixou o lodo e está maravilhado com a luz. Dom Bagrão está passando por uma transformação e necessita de amparo. O Bem sempre vence o mal, não tenha dúvida. Ajudemos, pois, Dom Bagrão, amando-o, e ele se modificará por completo. Já se esqueceu de que devemos amar aos nosso inimigos? Amar quem só nos faz bem é maravilhoso e fácil, meu filho; mas, amar aos inimigos, é sublime! Pense bastante nisso.
            Bola Branca pensou.
            - O senhor tem razão. Amar os inimigos é, mesmo, sublime!
            Vamos, então, ajudar Dom Bagrão?
            - E se ele não quiser ajuda?
            - Vamos ajudá-lo, mas em silêncio. Devemos fazer sempre a caridade que não humilha, ou seja, sem ostentação. Aconselho, pois, que todos os peixes da lagoa se reúnam hoje, a noite, e façam uma oração. Peçam a Deus que Dom Bagrão compreenda que a violência nunca resolveu problema algum e só traz graves complicações. Façam a oração e garanto que todos terão duas surpresas!
            Bola Branca quis perguntar que surpresas eram, mas...acordou nesse momento! E, lembrando-se das palavras do peixe luminoso, nadou com rapidez e foi contar o sonho aos seus amigos. Concordaram todos em fazer a oração naquela mesma noite. E, assim que Dom Bagrão dormiu, os peixinhos reuniram-se e, silenciosamente, oraram a Deus; mas, com tanto amor, que se tornaram luminosos!
            - Que beleza! Exclamou Bola Branca. A prece nos fez ficar tão brilhantes quanto o espírito que vi no sonho!
            - A segunda surpresa não demorou. Dom Bagrão, que não estava dormindo (ele, apenas, fechara os olhos) havia visto os peixes orarem para lhe ajudar....E, envergonhado das maldades que sempre praticara, aproximou-se dos peixinhos e, humilde, pediu-lhes perdão.
            - Estou perdoado?
            Viva o Dom Bagrão! Viva o Dom Bagrão! Responderam os peixinhos, muito alegres.
            E, soltando bolhinhas de ar, beijaram Dom Bagrão; inclusive, Bola Branca, que se tornou o seu melhor amigo.

(Iracema Sapucaia. O besouro casca dura)

Passatempo Espírita © 2013 - 2024. Todos os direitos reservados.

Desenvolvido por Webnode