É POSSÍVEL O ESPÍRITO SOFRER DURANTE A CREMAÇÃO?

A cremação é um dos processos mais antigos praticados pela humanidade, que consiste na ação de reduzir a cinzas um corpo morto de modo a queimá-lo totalmente. 

A cremação, na atualidade, é aceita por alguns cristãos e diversas outras denominações religiosas, mas sua prática é proibida por judeus ortodoxos e muçulmanos.

O Espiritismo não proibi a inceneração dos corpos, porém faz algumas ressalvas, explicando que o instante da morte  não é igual para todos e  os sofrimentos dos Espíritos são o resultado dos laços que ainda existem entre ele e a matéria, ou seja,  consequência da maneira como viveram na Terra.

Nas obras espíritas publicadas por Allan Kardec, não há informações específicas sobre o prática de cremação, porém há outras revelações que trazem esclarecimentos sobre este assunto.

Eis, o que temos em "O Livro dos Espíritos":

Como se opera a separação da alma e do corpo?
"Rotos os laços que a retinham, ela se desprende." (O Livro dos Espíritos. Questão 155. Allan Kardec)

Como considera o Espírito o corpo de que vem de separar-se?
"Como veste desconfortável que o incomodava, sentindo-se feliz por estar livre dela." (O Livro dos Espíritos. Questão 309. Allan Kardec)

Que sensação lhe causa o espetáculo do seu corpo em  decomposição ?
"Quase sempre se conserva indiferente a isso, como a uma coisa que em nada o interessa." (O Livro dos Espíritos. Questão 309 - a. Allan Kardec)

A separação se dá instantaneamente por brusca transição? Haverá alguma linha de demarcação nitidamente traçada entre a vida e a morte?
"Não; a alma se desprende gradualmente, não se escapa como um pássaro cativo a que se restitua subitamente a liberdade. Aqueles dois estados se tocam e confundem, de sorte que o Espírito se solta pouco a pouco dos laços que o prendiam. Estes laços se desatam, não se quebram."

"Durante a vida, o Espírito se acha preso ao corpo pelo seu envoltório semimaterial ou perispírito. A morte é a destruição do corpo somente, não a desse outro invólucro, que do corpo se separa quando cessa neste a vida orgânica. A observação demonstra que, no instante da morte, o desprendimento do perispírito não se completa subitamente; que, ao contrário, se opera gradualmente e com uma lentidão muito variável conforme os indivíduos. Em uns é bastante rápido, podendo dizer-se que o momento da morte é mais ou menos o da libertação. Em outros, naqueles sobretudo cuja vida foi toda material e sensual, o desprendimento é muito menos rápido, durando algumas vezes dias, semanas e até meses, o que não implica existir, no corpo, a menor vitalidade, nem a possibilidade de volver à vida, mas uma simples afinidade com o Espírito, afinidade que guarda sempre proporção com a preponderância que, durante a vida, o Espírito deu à matéria. É, com efeito, racional conceber-se que, quanto mais o Espírito se haja identificado com a matéria, tanto mais penoso lhe seja separar-se dela; ao passo que a atividade intelectual e moral, a elevação dos pensamentos operam um começo de desprendimento, mesmo durante a vida do corpo, de modo que, em chegando a morte, ele é quase instantâneo. Tal o resultado dos estudos feitos em todos os indivíduos que se têm podido observar por ocasião da morte. Essas observações ainda provam que a afinidade, persistente entre a alma e o corpo, em certos indivíduos, é, às vezes, muito penosa, porquanto o Espírito pode experimentar o horror da decomposição. Este caso, porém, é excepcional e peculiar a certos gêneros de vida e a certos gêneros de morte. Verifica-se com alguns, suicidas." (O Livro dos Espíritos. Questão 155 e 155-a. Allan Kardec)

Na Revista Espírita de dezembro de 1859, Allan Kardec afirma: "Os exemplos desta natureza são muito numerosos. Um dos mais expressivos é o do suicida da Samaritana (1), que relatamos no nosso número de junho de 1858.

Evocado alguns dias depois de sua morte, também afirmava estar vivo e dizia:
"Entretanto sinto que os  vermes me roem". Como fizemos notar no relato, não se tratava de uma lembrança, desde que em vida não era roído pelos vermes . Era então um sentimento atual, uma espécie de repercussão transmitida do corpo ao Espírito pela comunicação fluídica ainda existente entre eles. Essas comunicações nem sempre se traduzem da mesma maneira, entretanto, são sempre mais ou menos penosas e como um primeiro castigo para quem, quando vivo, muito se identificou com a matéria." (Revista Espírita. Dezembro de 1859. Um Espírito que não se acredita morto. Allan Kardec)

Na Revista Espírita de Dezembro de 1858, temos a seguinte explicação sobre este caso:

"Ora, seguramente os vermes não roem o perispírito e, ainda menos o Espírito. Apenas roem o corpo. Como a separação do corpo e do perispírito não era completa, o resultado era uma espécie de repercussão moral que lhe transmitia a sensação do que acontecia no corpo. Repercussão talvez não seja o vocábulo, o qual poderia fazer supor um efeito muito material. Era antes a visão daquilo que se passava em seu corpo, ao qual estava ligado o seu perispírito, que lhe produzia uma ilusão, que ele tomava como realidade. Assim, não é uma lembrança, pois que em vida não tinha sido roído pelos vermes. Era um sentimento atual.

Vemos por aí as deduções que podem ser tiradas dos fatos, quando observados com atenção. Durante a vida, o corpo recebe impressões exteriores e as transmite ao Espírito, por intermédio do perispírito, que constitui, provavelmente, aquilo que é chamado fluido nervoso. Morto, o corpo não mais sente, porque nele já não há Espírito nem perispírito. Desprendido do corpo, o perispírito experimenta a sensação. Entretanto, como esta não lhe chega através de um canal limitado, é geral. Ora, como na realidade existe apenas um agente transmissor, desde que é o Espírito que tem a consciência, disto resulta que se pudesse existir um perispírito sem Espírito, este não sentiria mais do que o corpo quando morto. Do mesmo modo, se o Espírito não tivesse perispírito, seria inacessível a qualquer sensação dolorosa. É isto o que acontece com os   Espíritos   completamente depurados. Sabemos que quanto mais se depuram, tanto mais eterizada se torna a essência do perispírito, de onde se segue que a influência material diminui à medida que o Espírito progride, isto é, à medida que o perispírito se torna menos grosseiro.

Dir-se-á, entretanto, que as sensações agradáveis são transmitidas ao Espírito pelo perispírito, assim como as desagradáveis. Ora, se o Espírito puro é inacessível a umas, deve sê-lo igualmente a outras. Sim, sem dúvida, às que provêm unicamente da influência da matéria que conhecemos. O som de nossos instrumentos, o perfume de nossas flores nenhuma impressão lhe causam.

(...)Dizendo que os  Espíritos   são inacessíveis às impressões de nossa matéria, queremos referir-nos aos  Espíritos muito elevados, cujo envoltório etéreo não tem analogia aqui na Terra. Já o mesmo não se dá com aqueles cujo perispírito é mais denso. Esses percebem os nossos sons, os nossos odores, mas não por uma parte limitada do seu ser, como quando vivos. Poder-se-ia dizer que as vibrações moleculares se fazem sentir em todo o seu ser e assim chegam ao sensorium commune, que é o próprio Espírito, posto que de maneira diferente e talvez mesmo com uma impressão diferente, o que produz uma modificação na percepção. " (Dezembro de 1858. Sensações dos Espíritos. Allan Kardec)

No entanto, na Revista Espírita de Abril de 1861, há outro relato de um homem de uns cinquenta anos, chamado Alfred Leroy, que suicidou-se também por desespero, porém o Espírito não cita que sofre os horrores da decomposição, pelo contrário, diz estar "relativamente feliz", após seis dias da sua morte.

Diante da resposta inusitada, o Espírito São Luiz foi evocado para dar esclarecimentos:

Podeis dizer qual a sorte do infeliz que acabamos de evocar?
"-  A expiação e o sofrimento. Não, não há contradição entre as primeiras palavras desse infortunado e as suas dores. Ele se diz feliz. Feliz pela cessação da vida. Como ainda está preso aos laços terrenos, ainda não sente senão a ausência do mal terreno, mas quando seu Espírito elevar-se, os horizontes da dor, da expiação lenta e terrível desenrolar-se-ão à sua frente e o conhecimento do infinito, ainda velado aos seus olhos, ser-lhe-á o suplício que entreviu."

Que diferença estabeleceis entre este suicida e o da Samaritana? Ambos se mataram de desespero, contudo sua situação é bem diversa: este se reconhece perfeitamente; fala com lucidez e ainda não sofre, ao passo que o outro não se julgava morto e desde os primeiros instantes sofria um suplício cruel, o de sentir a impressão de seu corpo em  decomposição.

" - Imensa diferença. O suplício de cada um desses homens reveste o caráter próprio de seu progresso moral. O último, alma fraca e quebrada, suportou tanto quanto acreditou. Duvidou de sua força, da bondade de Deus, mas não blasfemou nem maldisse; seu suplício interior, lento e profundo, terá a mesma intensidade de dor que a do primeiro suicida. Apenas não é uniforme a lei da expiação." (Revista Espírita. Abril de 1861. Palestras familiares de além-túmulo. Alfred Leroy, suicida. Allan Kardec)

Em "O Livro dos Espíritos", quando questionado sobre este assunto, os Espíritos Superiores confirmam estas observações,  vejamos:

Quais, em geral, com relação ao estado do Espírito, as conseqüências do suicídio?

"Muito diversas são as conseqüências do suicídio. Não há penas determinadas e, em todos os casos, correspondem sempre às causas que o produziram. Há, porém, uma conseqüência a que o suicida não pode escapar; é o desapontamento. Mas, a sorte não é a mesma para todos; depende das circunstâncias. Alguns expiam a falta imediatamente, outros em nova existência, que será pior do que aquela cujo curso interromperam."

"(...)A afinidade que permanece entre o Espírito e o corpo produz, nalguns suicidas, uma espécie de repercussão do estado do corpo no Espírito, que, assim, a seu mau grado, sente os efeitos da decomposição, donde lhe resulta uma sensação cheia de angústias e de horror, estado esse que também pode durar pelo tempo que devia durar a vida que sofreu interrupção. Não é geral este efeito; mas, em caso algum, o suicida fica isento das conseqüências da sua falta de coragem e, cedo ou tarde, expia, de um modo ou de outro, a culpa em que incorreu. Assim é que certos Espíritos, que foram muito desgraçados na Terra, disseram ter-se suicidado na existência precedente e submetido voluntariamente a novas provas, para tentarem suportá-las com mais resignação. " (O Livro dos Espíritos. Questão 957. Allan Kardec)

Na obra "O Céu e o Inferno", Allan Kardec também traz a seguinte informação:

"O Espírito sofre, quer no mundo corporal, quer no espiritual, a conseqüência das suas imperfeições. (...) A expiação varia segundo a natureza e gravidade da falta, podendo, portanto, a mesma falta determinar expiações diversas, conforme as circunstâncias, atenuantes ou agravantes, em que for cometida. Não há regra absoluta nem uniforme quanto à natureza e duração do castigo:  a única lei geral é que toda falta terá punição, e terá recompensa todo ato meritório, segundo o seu valor." (O Céu e o Inferno. 1ª Parte. Cap. 7. Código penal da vida futura. Itens 10 e 11.  Allan Kardec).

Em "O Livro dos Espíritos" temos um comentário de Allan Kardec sobre a sensação de alguns Espíritos quando é atingido pelo fogo, ou seja, quando o corpo físico já está morto:

"O corpo é o instrumento da dor. Se não é a causa primária desta é, pelo menos, a causa imediata. A alma tem a percepção da dor: essa percepção é o efeito. A lembrança que da dor a alma conserva pode ser muito penosa, mas não pode ter ação física. De fato, nem o frio, nem o calor são capazes de desorganizar os tecidos da alma, que não é suscetível de congelar-se, nem de queimar-se.

Não vemos todos os dias a recordação ou a apreensão de um mal físico produzirem o efeito desse mal, como se real fora? Não as vemos até causar a morte? Toda gente sabe que aqueles a quem se amputou um membro costumam sentir dor no membro que lhes falta. Certo que aí não está a sede, ou, sequer, o ponto de partida da dor. O que há, apenas, é que o cérebro guardou desta a impressão. Lícito, portanto, será admitir-se que coisa análoga ocorra nos sofrimentos do Espírito após a morte." (O Livro dos Espíritos.  Item  257. Allan Kardec)

Diante destas revelações, que evidenciam que após a morte o espírito de um suicida ou cuja vida foi toda material e sensual  os laços se desfazem lentamente do corpo físico,  surge o seguinte questionamento: cremando o corpo como fica a situação do espírito? 

Nestes casos específicos, o Espírito, cujo corpo foi cremado, poderá sentir ou não a sensação dolorosa do fogo, com uma espécie de "repercussão geral extremamente desagradável" no seu perispírito,  que não poderá ter ação física, pois a alma não é suscetível de queimar-se, do mesmo modo que o Espírito, cujo corpo foi sepultado, poderá sentir ou não os efeitos do processo de decomposição biológica, pois a expiação no mundo espiritual deverá ser proporcional, como sempre, à gravidade da falta, de acordo com as circunstâncias, ou seja, não é uma lei geral para todos.

Léon Denis, faz a seguinte elucidação: "Pergunta-se muitas vezes se a cremação é preferível ao sepultamento, do ponto de vista da separação do espírito. Os espíritos consultados respondem que em tese geral a cremação provoca um desprendimento mais rápido, mais brusco e violento, até mesmo doloroso para a alma ligada à Terra por seus costumes, seus gostos, suas paixões. "(O problema do ser, do destino e da dor. Cap. 10. Léon Denis)

Segundo o Espírito Humberto de Campos, "Para quem varou a existência na Terra entre abstinências e sacrifícios, a arte de dizer adeus é alguma coisa da felicidade ansiosamente saboreada pelo Espírito, mas para o comum dos mortais, afeitos aos "comes e bebes" de cada dia, para os senhores da posse física, para os campeões do conforto material e para os exemplares felizes do prazer humano, na mocidade ou na madureza, a cadaverização não é serviço de algumas horas. (...)  Para semelhantes viajores da grande jornada, a cremação imediata do comboio fisiológico será pesadelo terrível e doloroso." (Taça de luz. O problema da cremação. Espírito Humberto de Campos. Psicografado por Chico Xavier)

Se em cada país possui um tempo mínimo de espera para cremação, determinado por lei ou por costumes culturais,  por que muitos espíritas dizem que é recomendado a espera de 72 horas antes da cremação?

Por que em entrevista, Chico Xavier disse: "Emmanuel, no livro "O Consolador", (...) afirma que a cremação é um processo legítimo, de liberação do  espírito desencarnado, apenas aconselhando que o tempo de expectativa deve ser mais longo nos climas tropicais e subtropicais, nada menos de 72 horas de câmara fria para o nosso veículo carnal, quando nos desvencilhamos dele, no caso de optarmos pela cremação." ( Dos Hippies aos Problemas do Mundo. 18. Catástrofes, cremação e morte tranqüila. Entrevista feita por Almir. Chico Xavier)  

Na realidade, na questão 151, do livro "O Consolador", o Espírito Emmanuel não determina o tempo, apenas na obra " Caminhos de volta" temos esta informação, vejamos o trecho descrito:     

"Temos companheiros que, na desencarnação pelo fogo se liberam de improviso de qualquer conexão com os recursos que usufruíram na experiência material.  Entretanto, encontramos outros; em vasta maioria, que embora a lenta desencarnação progressiva que atravessaram, se reconhecem singularmente detidos nas impressões e laços da vida material, notadamente nas primeiras cinquenta horas que se seguem à derradeira parada cardíaca no carro fisiológico.  Fácil observar, em vista disso, que o período de espera, no espaço razoável de setenta e duas horas, entre o enrijecimento do corpo físico e a cremação respectiva, é tempo valioso para a generalidade de todos aqueles que se encontram em trânsito de uma vida para outra. "(Caminhos de volta. Cremação. Espírito Emmanuel. Psicografado por Chico Xavier)

Se esta teoria for verdadeira, é preciso reconhecer que aguardar determinado período de tempo é uma recomendação geral para os Espíritos inferiores encarnados na Terra, de modo que não sofram o impacto do rompimento dos laços de forma súbita e violenta, pois os Espíritos que praticaram o bem se conservam indiferentes a isto. Além disso, ainda que prevaleça Espíritos inferiores na Terra poderá haver exceções, pois tudo depende, do grau de evolução moral, da maneira como o Espírito viveu e do gênero de morte. Por exemplo, no caso dos suicidas, verifica-se que alguns podem sofrer depois deste prazo como forma de expiação,  considerando que o desprendimento é muito mais lento, durando algumas vezes dias, semanas e até meses.

É importante lembrar que nem toda revelação mediúnica isolada deve ser considerada verdadeira, Allan Kardec recomenda que deve ser passada pela prova do "Controle Universal dos Ensinos dos Espíritos" (CUEE). Em outras palavras, esta teoria do Espírito Emmanuel que determina tempo de espera para cremação precisa ainda ser confirmada por outros espíritos, através de outros médiuns.

 Obs.(1): Na Revista Espírita de Junho de 1858, relata que o suicida da Samaritana foi evocado seis dias apenas depois de sua morte e sentia-se também "sufoco no caixão". 

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