No Evangelho de Mateus 19:3-9, relata que os fariseus fizeram uma pergunta semelhante à Jesus dizendo:
"É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo?
Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez.
E disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá à sua mulher, e serão os dois em uma carne?
Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.
Disseram-lhe eles: Então, por que mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio, e repudiá-la?
Disse-lhes ele: Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres; mas ao princípio não foi assim.
Eu vos digo, porém, que qualquer que repudiar sua mulher, não sendo por causa de fornicação, e casar com outra, comete adultério; e o que casar com a repudiada também comete adultério."
Diante desta questão, Allan Kardec faz uma pergunta aos Espíritos Superiores e obtém a seguinte resposta:
Está na lei da Natureza, ou somente na lei humana, a indissolubilidade absoluta do casamento?
"É uma lei humana muito contrária à da Natureza. Mas os homens podem modificar suas leis; só as da Natureza são imutáveis." (O Livro dos Espíritos. Questão 697. Allan Kardec)
"Imutável só há o que vem de Deus. Tudo o que é obra dos homens está sujeito a mudança. As leis da Natureza são as mesmas em todos os tempos e em todos os países. As leis humanas mudam segundo os tempos, os lugares e o progresso da inteligência. (...) Assim é, por exemplo, que, em certos países, o casamento religioso é o único legítimo; noutros é necessário, além desse, o casamento civil; noutros, finalmente, este último casamento basta." (O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. 22. Item 2. Allan Kardec)
No casamento, há uma ordem divina que é a união dos sexos, para que se opere a substituição dos seres que morrem.
"Mas, na união dos sexos, a par da lei divina material, comum a todos os seres vivos, há outra lei divina, imutável como todas as leis de Deus, exclusivamente moral: a lei de amor. Quis Deus que os seres se unissem não só pelos laços da carne, mas também pelos da alma, a fim de que a afeição mútua dos esposos se lhes transmitisse aos filhos e que fossem dois, e não um somente, a amá-los, a cuidar deles e a fazê-los progredir. Nas condições ordinárias do casamento, a lei de amor é tida em consideração? De modo nenhum. Não se leva em conta a afeição de dois seres que, por sentimentos recíprocos, se atraem um para o outro, visto que, as mais das vezes, essa afeição é rompida. O de que se cogita, não é da satisfação do coração e sim da do orgulho, da vaidade, da cupidez, numa palavra: de todos os interesses materiais. Quando tudo vai pelo melhor consoante esses interesses, diz-se que o casamento é de conveniência e, quando as bolsas estão bem aquinhoadas, diz-se que os esposos igualmente o são e muito felizes hão de ser." (O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. 22. Item 3. Allan Kardec)
Sendo assim, em concordância com este pensamento, o irmão Saulo orienta: " (...) o casamento civil deve efetuar-se por amor e não por conveniência de qualquer espécie. A falta de conjugação dessas duas leis, a humana, e a divina, é a causa principal dos fracassos no casamento." (Na era do Espírito. O Cultivo do amor. Irmão Saulo. Psicografado por Chico Xavier /J. Herculano Pires)
O médium Chico Xavier faz a seguinte elucidação: " O casamento , para ser sólido, há de ser uma união de almas afins, mas, sem espírito de tolerância, casamento algum vai adiante... União de almas simpáticas é uma raridade sobre a Terra. Quase todos estamos vinculados aos nossos compromissos de existências anteriores... Com o passar do tempo, o casal que descobre entre si certas diferenças não deve se assustar; é natural que seja assim... Se não houver amor, que pelo menos haja respeito. Tenho visto muitos casamentos se desfazerem por causa do extremo egoísmo dos cônjuges, que não se dispõem a um mínimo de sacrifício e de renúncia. Ora, estamos ainda muito longe do amor com que devemos nos consagrar uns aos outros, mas nada nos impede de começar a exercitar a paciência, o perdão, o silêncio... Se um não revidasse quando fosse ofendido pelo outro, teríamos um número infinitamente menor de separações conjugais!..." (O Evangelho de Chico Xavier. Item 58. Chico Xavier. Carlos A. Baccelli)
O escritor espírita Martins Peralva, ao analisar alguns casos de matrimônio, fez uma tentativa de classificá-lo em cinco tipos principais, assim compreendidos: Acidentais, provacionais, sacrificiais, afins, (afinidade superior) transcendentes.
"Acidentais: Encontro de almas inferiorizadas, por efeito de atração momentânea, sem qualquer ascendente espiritual.
Provacionais: Reencontro de almas, para reajustes necessários à evolução de ambos.
Sacrificiais: Reencontro de alma iluminada com alma inferiorizada, com o objetivo de redimi-la.
Afins: Reencontro de corações amigos, para consolidação de afetos.
Transcendentes: Almas engrandecidas no Bem e que se buscam para realizações imortais.
Evidentemente, o instituto do matrimônio, sagrado em suas origens, tem reunido no mesmo teto os mais variados tipos evolutivos, o que vem demonstrar que a união, na Terra, funciona, às vezes como meio de consolidação de laços de pura afinidade espiritual, e, noutros casos, em sua maioria, como instrumento de reajuste. (...)Nos casamentos acidentais teremos aquelas pessoas que, defrontando-se um dia, se vêem, se conhecem, se aproximam, surgindo, daí, o enlace acidental, sem qualquer ascendente espiritual. Funcionou, apenas, o livre arbítrio, uma vez que por ele construímos cotidianamente o nosso destino. Num mundo como o nosso, tais casamentos são comuns."(Estudando a mediunidade. Cap.18. Espiritismo e lar. Martins Peralva)
De acordo com o Espírito André Luiz, "Não podemos olvidar que, na Terra, o matrimônio pode assumir aspectos variados, objetivando múltiplos fins." (Evolução em dois mundos. Cap. 8. Matrimônio e divórcio. Espírito André Luiz. Psicografado por Chico Xavier)
O Espírito Emmanuel faz o seguinte esclarecimento: "O casamento será sempre um instituto benemérito, acolhendo, no limiar, em flores de alegria e esperança. Aqueles que a vida aguarda para o trabalho do seu próprio aperfeiçoamento e perpetuação. Com ele, o progresso ganha novos horizontes e a lei do renascimento atinge os fins para os quais se encaminha. Ocorre, entretanto, que a Sabedoria Divina jamais institui princípios de violência, e o Espírito, conquanto em muitas situações agrave os próprios débitos, dispõe da faculdade de interromper, recusar, modificar, discutir ou adiar, transitoriamente, o desempenho dos compromissos que abraça.
Em muitos lances da experiência, é a própria individualidade, na vida do Espírito, antes da reencarnação, que assinala a si mesma o casamento difícil que faceará na estância física, chamando a si o parceiro ou a parceira de existências pretéritas para os ajustes que lhe pacificarão a consciência, à vista de erros perpetrados em outras épocas. Reconduzida, porém, à ribalta terrestre e assumida a união esponsalícia que atraiu a si mesma, ei-la desencorajada à face dos empeços que se lhe desdobram à frente. Por vezes, o companheiro ou a companheira voltam ao exercício da crueldade de outro tempo, seja através de menosprezo, desrespeito, violência ou deslealdade, e o cônjuge prejudicado nem sempre encontra recursos em si para se sobrepor aos processos de dilapidação moral de que é vítima.
Compelidos, muita vez, às últimas fronteiras da resistência, é natural que o esposo ou a esposa, relegado a sofrimento indébito, se valha do divórcio por medida extrema contra o suicídio, o homicídio ou calamidades outras que lhes complicariam ainda mais o destino. Nesses lances da experiência, surge a separação à maneira de bênção necessária e o cônjuge prejudicado encontra no tribunal da própria consciência o apoio moral da auto-aprovação para renovar o caminho que lhe diga respeito, acolhendo ou não nova companhia para a jornada humana. Óbvio que não nos é lícito estimular o divórcio em tempo algum, competindo-nos tão-somente, nesse sentido, reconfortar e reanimar os irmãos em lide, nos casamentos de provação, a fim de que se sobreponham às próprias suscetibilidades e aflições, vencendo as duras etapas de regeneração ou expiação que rogaram antes do renascimento no Plano Físico, em auxílio a si mesmos; ainda assim. é justo reconhecer que a escravidão não vem de Deus e ninguém possui o direito de torturar ninguém, à face das leis eternas. O divórcio, pois, baseado em razões justas, é providência humana e claramente compreensível nos processos de evolução pacífica." (Vida e sexo. Cap. 8. Divórcio. Espírito Emmanuel. Psicografado por Chico Xavier)
De acordo com Allan Kardec, "O divórcio é lei humana que tem por objeto separar legalmente o que já, de fato, está separado. Não é contrário à lei de Deus, pois que apenas reforma o que os homens hão feito e só é aplicável nos casos em que não se levou em conta a lei divina. (...)Mas, nem mesmo Jesus consagrou a indissolubilidade absoluta do casamento. Não disse ele: "Foi por causa da dureza dos vossos corações que Moisés permitiu despedísseis vossas mulheres"? Isso significa que, já ao tempo de Moisés, não sendo a afeição mútua a única determinante do casamento, a separação podia tornar-se necessária. Acrescenta, porém: "no princípio, não foi assim", isto é, na origem da Humanidade, quando os homens ainda não estavam pervertidos pelo egoísmo e pelo orgulho e viviam segundo a lei de Deus, as uniões, derivando da simpatia, e não da vaidade ou da ambição, nenhum ensejo davam ao repúdio. Vai mais longe: especifica o caso em que pode dar-se o repúdio, o de adultério. Ora, não existe adultério onde reina sincera afeição recíproca. " (O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. 22. Item 5. Allan Kardec)
"No estado dos nossos costumes, de nossas exigências sociais, o casamento necessita ser regulado pela lei, e a prova de que esta lei não é absoluta é que não é a mesma para todos os países civilizados. É, pois, permitido pensar que nos mundos superiores, onde não há os mesmos interesses materiais a salvaguardar, onde não existe o mal, isto é, onde os Espíritos maus são excluídos da encarnação, onde, conseguintemente, as uniões resultam da simpatia e não do cálculo, as condições devam ser diferentes. (...)Para os Espíritos superiores não há mais encarnação material e, consequentemente, não há procriação, pois esta se dá pelo corpo e não pelo Espírito. Uma afeição pura é, pois, o único objetivo da união e, por isto, ao contrário do que ocorre na Terra, não necessita da sanção oficial." (Revista Espírita. Julho de 1862. União simpática de almas. Allan Kardec)
Os Espíritos Superiores trazem outros apontamentos sobre este assunto, quando Allan Kardec faz as seguintes perguntas:
As almas que devam unir-se estão, desde suas origens, predestinadas a essa união e cada um de nós tem, nalguma parte do Universo, sua metade, a que fatalmente um dia se reunirá?
"Não; não há união particular e fatal, de duas almas. A união que há é a de todos os Espíritos, mas em graus diversos, segundo a categoria que ocupam, isto é, segundo a perfeição que tenham adquirido. Quanto mais perfeitos, tanto mais unidos. Da discórdia nascem todos os males dos humanos; da concórdia resulta a completa felicidade." (O Livro dos Espíritos. Questão 298. Allan Kardec)
"A teoria das metades eternas encerra uma simples figura, representativa da união de dois Espíritos simpáticos. (...)Não se deve, pois, aceitar a idéia de que, criados um para o outro, dois Espíritos tenham, fatalmente, que se reunir um dia na eternidade, depois de haverem estado separados por tempo mais ou menos longo. " (O Livro dos Espíritos. Questão 303 - a). Comentário de Allan Kardec)
Portanto, a expressão "alma gêmea", usada na linguagem vulgar, não deve tomar ao pé da letra, pois não existem almas predestinadas umas às outras.
Os parentes e amigos sempre se reúnem depois da morte?
"Depende isso da elevação deles e do caminho que seguem, procurando progredir. Se um está mais adiantado e caminha mais depressa do que outro, não podem os dois conservar-se juntos. Ver-se-ão de tempos a tempos, mas não estarão reunidos para sempre, senão quando puderem caminhar lado a lado, ou quando se houverem igualado na perfeição. Acresce que a privação de ver os parentes e amigos é, às vezes, uma punição." (O Livro dos Espíritos. Questão 290. Allan Kardec)
"Deus permite aos que se amam sinceramente e souberam sofrer com resignação para expiar suas faltas, reunir-se, a princípio no mundo dos Espíritos, onde progridem juntos, a fim de conseguirem encarnações nos mundos superiores. Podem, pois, se o pedirem com fervor, deixar os mundos espíritas na mesma época, reencarnar-se nos mesmos lugares e, por um encadeamento de circunstâncias previstas, reunir-se pelos laços que mais convierem aos seus corações. Uns terão pedido para serem pai ou mãe de um Espírito que lhes era simpático e se sentirão felizes por o dirigirem no bom caminho, cercando-o dos ternos cuidados da família e da amizade. Outros terão pedido a graça de se unirem pelo matrimônio e verem escoar-se muitos anos de felicidade e de amor. Refiro-me ao casamento entendido no sentido da união íntima de dois seres que não querem separar-se mais. Entretanto, tal como é compreendido na Terra, o casamento não é conhecido nos mundos superiores. Nesses lugares de felicidade, de liberdade e de alegria, os laços são de flores e de amor. (...) E os seres privilegiados dessas regiões abençoadas, sentindo-se mais fortemente ligados por semelhantes sentimentos do que o são os homens da Terra, que muitas vezes desprezam os mais sagrados compromissos, não oferecem o deplorável espetáculo de uniões perturbadas incessantemente pela influência dos vícios, das paixões inferiores, da inconstância, da inveja, da injustiça, da aversão, de todas essas horríveis inclinações que conduzem ao mal, ao perjúrio e à violação dos mais solenes juramentos. " (Revista Espírita. Julho de 1862. União simpática de almas. Allan Kardec)
Podem dois seres, que se conheceram e estimaram, encontrar-se noutra existência corporal e reconhecer-se?
"Reconhecer-se, não. Podem, porém, sentir-se atraídos um para o outro. E, freqüentemente, diversa não é a causa de íntimas ligações fundadas em sincera afeição. Um do outro dois seres se aproximam devido a circunstâncias aparentemente fortuitas, mas que na realidade resultam da atração de dois Espíritos, que se buscam reciprocamente por entre a multidão." (O Livro dos Espíritos. Questão 386. Allan Kardec)
Os encontros, que costumam dar-se, de algumas pessoas, e que comumente se atribuem ao acaso , não serão efeito de uma certa relação de simpatia?
"Entre os seres pensantes há ligações que ainda não conheceis. O magnetismo é o piloto desta ciência, que mais tarde compreendereis melhor." (O Livo dos Espíritos. Questão 388. Allan Kardec)
Qual a causa das simpatias e antipatias que se manifestam entre pessoas que se veem pela primeira vez?
"São quase sempre entes que se conheceram e, algumas vezes, se amaram em uma existência anterior, e que, encontrando-se nesta, são atraídos um para o outro. As antipatias instintivas provêm também, muitas vezes, de relações anteriores." (O que é o Espiritismo. Cap. 3. Questão 125. Allan Kardec)
A simpatia tem sempre por princípio um anterior conhecimento?
"Não. Dois Espíritos, que se ligam bem, naturalmente se procuram um ao outro, sem que se tenham conhecido como homens." (O Livro dos Espíritos. Questão 387. Allan Kardec)
Uma vez que os Espíritos simpáticos são induzidos a unir-se, como é que, entre os encarnados, freqüentemente só de um lado há afeição e que o mais sincero amor se vê acolhido com indiferença e, até, com repulsão? Como é, além disso, que a mais viva afeição de dois seres pode mudar-se em antipatia e mesmo em ódio?
"Não compreendes então que isso constitui uma punição, se bem que passageira? Depois, quantos não são os que acreditam amar perdidamente, porque apenas julgam pelas aparências, e que, obrigados a viver com as pessoas amadas, não tardam a reconhecer que só experimentaram um encantamento material! Não basta uma pessoa estar enamorada de outra que lhe agrada e em quem supõe belas qualidades. Vivendo realmente com ela é que poderá apreciá-la. Tanto assim que, em muitas uniões, que a princípio parecem destinadas a nunca ser simpáticas, acabam os que as constituíram, depois de se haverem estudado bem e de bem se conhecerem, por votar-se, reciprocamente, duradouro e terno amor, porque assente na estima! Cumpre não se esqueça de que é o Espírito quem ama e não o corpo, de sorte que, dissipada a ilusão material, o Espírito vê a realidade."
"Duas espécies há de afeição: a do corpo e a da alma, acontecendo com freqüência tomar-se uma pela outra. Quando pura e simpática, a afeição da alma é duradoura; efêmera a do corpo. Daí vem que, muitas vezes, os que julgavam amar-se com eterno amor passam a odiar-se, desde que a ilusão se desfaça." (O Livro dos Espíritos. Questão 939. Allan Kardec)
Não constitui igualmente fonte de dissabores, tanto mais amargos quanto envenenam toda a existência, a falta de simpatia entre seres destinados a viver juntos?
"Amaríssimos, com efeito. Essa, porém, é uma das infelicidades de que sois, as mais das vezes, a causa principal. Em primeiro lugar, o erro é das vossas leis. Julgas, porventura, que Deus te constranja a permanecer junto dos que te desagradam? Depois, nessas uniões, ordinariamente buscais a satisfação do orgulho e da ambição, mais do que a ventura de uma afeição mútua. Sofreis então as conseqüências dos vossos prejuízos." (O Livro dos Espíritos. Questão 940. Allan Kardec)
Mas, nesse caso, não há quase sempre uma vítima inocente?
"Há e para ela é uma dura expiação. Mas, a responsabilidade da sua desgraça recairá sobre os que lhe tiverem sido os causadores. Se a luz da verdade já lhe houver penetrado a alma, em sua fé no futuro haurirá consolação. Todavia, à medida que os preconceitos se enfraquecerem, as causas dessas desgraças íntimas também desaparecerão." (O Livro dos Espíritos. Questão 940 - a). Allan Kardec)
Em outras palavras, os Espíritos Superiores esclarecem que nem sempre as uniões se estabelecem por afeição da alma, pura e simpática ou devido à ligações que remontam existências anteriores, cuja a finalidade seria a evolução, cumprir provas, sofrer expiação ou realizar a reparação de alguma falta. Há casamentos acidentais que se estabelecem simplesmente por cálculo ou conveniência, ou seja, por atração sexual, interesses financeiros, aparência exterior ou posição social. Neste caso, muitas vezes, o divórcio também se torna inevitável e a lei civil dos homens serve de medida necessária à separação dos casais, pois logo que se percebe que o encantamento era apenas material, passam a odiar-se, uma vez que o amor nunca existiu.
Na Revista Espírita de 1864, há registro de um caso de matrimônio por interesse material que ocasionou uma desgraça.
O Monde illustré, de 7 de fevereiro de 1863, conta o seguinte drama de família que, com justa razão, comoveu a sociedade de Florença. Assim começa o autor a sua narração:
"Eis a história. Ele era um velho de setenta e dois anos; ela, uma jovem de vinte. Haviam casado há três anos... Não vos revolteis! o velho conde, originário de Viterbo, era absolutamente sem família, o que é muito estranho para um milionário! Amália não era sem família, mas antes sem milhões. Para compensar as coisas, quase a tendo visto nascer, sabendo-a de bom coração e de espírito encantador, ele tinha dito à mãe: "Deixai-me paternalmente casar com Amália; durante alguns anos ela cuidará de mim; e depois..."
"Fez-se o casamento. Amália compreende os seus deveres; cerca o velho dos mais assíduos cuidados e lhe sacrifica todos os prazeres de sua idade. Tendo o conde ficado cego e quase paralitico, ela passava longas horas do dia a lhe fazer companhia, leituras, a lhe contar tudo quanto o podia distrair e encantar. "Como sois boa, minha cara filha!", exclamava ele muitas vezes, tomando-lhe as mãos e atraindo-a para depor sobre sua fronte o casto e doce beijo da ternura e do reconhecimento.
"Entretanto, um dia notou que Amália se afasta de sua pessoa; que, embora sempre assídua e cheia de solicitude, parece temer sentar-se ao seu lado. Uma suspeita lhe atravessa o espírito. Uma noite, quando ela fazia a leitura, ele lhe agarra o braço, a atrai para si e enlaça-lhe a cintura; então, soltando um grito terrível, cai desmaiado de emoção e de cólera aos pés da jovem! Amália perde a cabeça; lança-se para a escada, atinge o andar mais alto da casa, precipita-se pela janela e cai despedaçada. O velho não sobreviveu mais que seis horas a esta catástrofe."
Haverão de perguntar que relação pode ter esta história com o Espiritismo.
(...) Se se examinar a coisa do ponto de vista puramente mundano, a maioria só verá nele a conseqüência muito natural de uma união desproporcionada e atirará no velho a pedra do ridículo como oração fúnebre; outros acusarão de ingratidão a jovem mulher que enganou a confiança do homem generoso que queria enriquecê-la. Mas, para o espírita, ela tem um lado mais sério, pois aí busca um ensinamento. Então perguntaremos se, na ação do velho, não haveria mais egoísmo que generosidade ao submeter uma moça, quase criança, à sua caducidade, por laços indissolúveis, numa idade em que, antes, deveria pensar no recolhimento, e não nos prazeres da vida? Se, impondo-lhe esse duro sacrifício, não era fazê-la pagar bem caro a fortuna que ele lhe prometera? Não há verdadeira generosidade sem desinteresse. Quanto à jovem, não podia aceitar esses laços senão com a perspectiva de os ver rompidos em breve, já que nenhum motivo de afeição a ligava ao velho. Havia, pois, cálculo de ambos os lados e esse cálculo foi frustrado; Deus não permitiu que nenhum deles o aproveitasse, infligindo a desilusão a um e a vergonha ao outro, que os mataram a ambos.
Resta a responsabilidade do suicídio, que jamais fica impune, mas que, muitas vezes, encontra circunstâncias atenuantes. A mãe da moça, para a encorajar a aceitá-lo, havia dito: "Com esta grande fortuna farás a felicidade do homem pobre que amares. Enquanto esperas, honra e respeita esse grande coração que quis fazer-te sua herdeira, durante o tempo que lhe restar de vida."
(...)A jovem errou ao ceder, mas a mãe errou mais em excitá-la e certamente é ela que incorrerá na maior parte da responsabilidade do suicídio da filha. Assim, aquele que se mata para escapar à miséria é culpado da falta de coragem e de resignação, mas, muito mais culpado ainda, é o causador primário desse ato de desespero." (Revista Espírita. Fevereiro 1864. Um drama íntimo. Allan Kardec)
"(...) Daí as uniões infelizes, que acabam tornando-se criminosas, dupla desgraça que se evitaria ao estabelecerem-se as condições do matrimônio, se não abstraísse da única que o sanciona aos olhos de Deus: a lei de amor. Ao dizer Deus: "Não sereis senão uma só carne", e quando Jesus disse: "Não separeis o que Deus uniu", essas palavras se devem entender com referência à união segundo a lei imutável de Deus e não segundo a lei mutável dos homens." (O Evangelho Segundo o Espiritismo. Cap. 22. Item 3. Allan Kardec)
Entretanto, ainda que alguns casais tenham se unido com base na lei de amor, podem surgir decepções no decorrer do percurso, pois a humanidade é imperfeita moralmente. Num mundo de provas e expiações , a grande maioria dos casais ainda não desenvolveu o sentimento puro do amor, compartilhado em mundos superiores. No entanto, embora o coração humano seja um abismo de corrupção, sempre há, o gérmen deste sentimento sublime, que o impele a tolerar e perdoar o cônjuge. Sendo assim, as dificuldades poderão ser superadas, dia a dia, pelo cultivo do amor.
Segundo o Espírito André Luiz , "(...) amar não é apenas fantasiar, mas acima de tudo, construir. E construir pede não somente plano e esperança, mas também suor e por vezes aflição e lágrimas.
Auxiliemos, na Terra, a compreensão do casamento como sendo um comércio de realizações e concessões mútuas, cuja falência é preciso evitar." (Apostilas da vida. Casamento e divórcio. Espírito André Luiz. Psicografado por Chico Xavier)
É óbvio que não nos é permitido estimular o divórcio por qualquer motivo insignificante, porém nenhum indivíduo deve tolerar permanecer num casamento infeliz, onde haja um relacionamento abusivo. Ninguém deve aceitar a criminalidade em nome do amor. Se algum dos cônjuges estiver sofrendo abuso psicológico, físico, sexual ou financeiro, não deve ter dúvidas em buscar ajuda e recorrer a lei humana, procurando atendimento de psicólogo, órgãos especializados ou orientação jurídica.