Acerca deste assunto, em "O Livro dos Espíritos", Allan Kardec faz algumas perguntas aos Espíritos Superiores e obteve as seguintes respostas:
Poderá ser tão adiantado quanto o de um adulto o Espírito de uma criança que morreu em tenra idade?
"Algumas vezes o é muito mais, porquanto pode dar-se que muito mais já tenha vivido e adquirido maior soma de experiência, sobretudo se progrediu." (O Livro dos Espíritos. Questão 197. Allan Kardec)
Pode então o Espírito de uma criança ser mais adiantado que o de seu pai?
"Isso é muito frequente. Não o vedes vós mesmos tão amiudadas vezes na Terra?" (O Livro dos Espíritos. Questão 197 -a. Allan Kardec)
É tão desenvolvido, quanto o de um adulto, o Espírito que anima o corpo de uma criança?
"Pode até ser mais, se mais progrediu. Apenas a imperfeição dos órgãos infantis o impede de se manifestar. Obra de conformidade com o instrumento de que dispõe." (O Livro dos Espíritos. Questão 379. Allan Kardec)
Abstraindo do obstáculo que a imperfeição dos órgãos opõe à sua livre manifestação, o Espírito, numa criancinha, pensa como criança ou como adulto?
"Desde que se trate de uma criança, é claro que, não estando ainda nela desenvolvidos, não podem os órgãos da inteligência dar toda a intuição própria de um adulto ao Espírito que a anima. Este, pois, tem, efetivamente, limitada a inteligência, enquanto a idade lhe não amadurece a razão. A perturbação que o ato da encarnação produz no Espírito não cessa de súbito, por ocasião do nascimento. Só gradualmente se dissipa, com o desenvolvimento dos órgãos."
"Há um fato de observação que apoia esta resposta. Os sonhos, numa criança, não apresentam o caráter dos de um adulto. Quase sempre pueril é o objeto dos sonhos infantis, o que indica de que natureza são as preocupações do respectivo Espírito." (O Livro dos Espíritos. Questão 380. Allan Kardec)
Por morte da criança, readquire o Espírito, imediatamente, o seu precedente vigor?
"Assim tem que ser, pois que se vê desembaraçado de seu envoltório corporal. Entretanto, não readquire a anterior lucidez senão quando se tenha completamente separado daquele envoltório, isto é, quando mais nenhum laço exista entre ele e o corpo." (O Livro dos Espíritos. Questão 381. Allan Kardec)
A alma tem consciência de si mesma imediatamente depois de deixar o corpo?
"Imediatamente não é bem o termo. A alma passa algum tempo em estado de perturbação." (O Livro dos Espíritos. Questão 163. Allan Kardec)
A perturbação que se segue à separação da alma e do corpo é do mesmo grau e da mesma duração para todos os Espíritos?
"Não; depende da elevação de cada um. Aquele que já está purificado, se reconhece quase imediatamente, pois que se libertou da matéria antes que cessasse a vida do corpo, enquanto que o homem carnal, aquele cuja consciência ainda não está pura, guarda por muito mais tempo a impressão da matéria." (O Livro dos Espíritos. Questão 164. Allan Kardec)
No livro "O que é o Espiritismo", temos a seguinte observação:
"O tempo da perturbação, sequente à morte, é muito variável; pode ser de algumas horas somente, como de muitos dias, meses ou, mesmo, de muitos anos. É menos longa, entretanto, para aqueles que, quando vivos, se identificaram com o seu estado futuro, porque esses compreendem imediatamente a sua situação; porém, é tanto mais longa quanto mais materialmente o indivíduo viveu." (O que é o Espiritismo. Cap. 3. Questão 145. Allan Kardec)
Em "O Livro dos Médiuns", há esclarecimentos com mais detalhes sobre este assunto:
Como pode o Espírito de uma criança, que morreu em tenra idade, responder com conhecimento de causa, se, quando viva, ainda não tinha consciência de si mesma?
"A alma da criança é um Espírito ainda envolto nas faixas da matéria; porém, desprendido desta, goza de suas faculdades de Espírito , porquanto os Espíritos não têm idade, o que prova que o da criança já viveu. Entretanto, até que se ache completamente desligado da matéria, pode conservar, na linguagem, traços do caráter da criança ."
" Nota. A influência corpórea, que se faz sentir, por mais ou menos tempo, sobre o Espírito da criança , igualmente é notada, às vezes, no Espírito dos que morreram em estado de loucura. O Espírito , em si mesmo, não é louco; sabe-se, porém, que certos Espíritos julgam, durante algum tempo, que ainda pertencem a este mundo. Não é, pois, de admirar que, no louco, o Espírito ainda se ressinta dos entraves que, durante a vida, se opunham à livre manifestação de seus pensamentos, até que se encontre completamente desprendido da matéria. Este efeito varia, conforme as causas da loucura, porquanto há loucos que, logo depois da morte, recobram toda a sua lucidez." (O Livro dos Médiuns. Cap. 25. Item 282. Questão 35. Allan Kardec)
Na obra "O Céu e o inferno" relata o caso de uma criança de oito a dez anos, chamada Marcel, designada apenas sob o n° 4 no hospital onde se encontrava, no qual apresentava o corpo tomado por uma só ferida e seus sofrimentos eram atrozes, apesar de ser um Espírito adiantado, conforme a descrição a seguir:
"Pertencia a uma pobre família israelita, e essa triste posição durava há quatro anos. Sua inteligência era notável para a idade; sua doçura, sua paciência e resignação eram edificantes. O médico, sob cujo cuidado ele se encontrava, tocado de compaixão por esse pobre ser de algum modo abandonado, pois não parecia que os pais o viessem ver com frequência, interessou-se por ele, e tinha prazer em conversar com ele, encantado com sua razão precoce.
(...)Um dia, a criança disse-lhe: "Doutor, tende a bondade de me dar mais pílulas, como as últimas que me receitastes. - E por que isso, minha criança? disse o médico; dei-te o suficiente, e temeria que uma quantidade maior te fizesse mal. - É que, como vedes, retomou a criança, eu sofro tanto que por mais que me esforce para não gritar, e peça a Deus que me dê força para não incomodar os outros doentes que estão ao meu lado, muitas vezes tenho muita dificuldade para me impedir de fazê-lo; essas pílulas me adormecem, e durante esse tempo ao menos eu não incomodo ninguém."
Essas palavras bastam para mostrar a elevação da alma que esse corpo disforme encerrava. (...)Essa criança morreu, e seus últimos pensamentos foram para Deus e para o médico caridoso que tivera compaixão dele.
Algum tempo depois ela foi evocada na Sociedade de Paris, onde deu a comunicação seguinte. (1863)
P. (...) vossos sofrimentos não eram a expiação de faltas anteriores?
R. Eles não eram uma expiação direta, mas ficai seguros de que toda dor tem sua causa justa. (...) Eu a solicitei para terminar meu aperfeiçoamento...
O Espírito Santo Agostinho faz a seguinte observação: "Pobre pequeno ser sofredor, fraco, ulceroso e disforme! Quantos gemidos deixava ouvir neste asilo de miséria e de lágrimas! E apesar da sua pouca idade, como era resignado, e como sua alma já compreendia a finalidade dos sofrimentos! (...)E agora o Espírito da pobre criança retomou suas proporções; plana no espaço, indo do fraco ao pequeno, dizendo a todos: Esperança e coragem. Desprendido de toda matéria e de toda mácula, ele está aí perto de vós, fala-vos, não mais com sua voz débil e queixosa, mas com másculos acentos; ele vos disse: Aqueles que me olharam, viram a criança que não murmurava; extraíram daí a calma para seus males, e seus corações se fortaleceram na doce confiança em Deus; eis a finalidade da minha curta passagem na terra." (O Céu e o Inferno. Segunda Parte. Cap. 8. Expiações terrestres .Marcel. Allan Kardec)
Este foi um exemplo de uma criança de caráter moral elevado, que até mesmo durante a encarnação, agia com a atitude de um Espírito adulto. Entretanto, existem espíritos de crianças e adultos em diversos graus de evolução. Até mesmo um Espírito, que morreu na fase adulta, pode agir com características de uma criança, se for um Espírito pouco amadurecido espiritualmente.
Na Revista Espírita 1868, temos um exemplo deste, quando o Espírito Flageolet foi evocado e afirmou ter realizado algumas brincadeiras, fazendo objetos desaparecerem e provocando barulhos numa uma sessão mediúnica, e obtemos o seguinte esclarecimento:
"O caráter desse Espírito não é o de uma criança traquinas? Contudo, em vida era um homem feito e até de uma certa idade. Certos Espíritos voltariam, então, a ser crianças? Não; o Espírito realmente adulto não volta atrás, assim como o rio não remonta à sua fonte. Mas a idade do corpo não é absolutamente um indício da idade do Espírito. Como é necessário que todos os Espíritos que se encarnam passem pela infância corporal, resulta que em corpos de crianças se encontrem, forçosamente, Espíritos adiantados. Ora, se esses Espíritos morrem prematuramente, revelam sua superioridade a partir do momento que se despojaram de seu envoltório. Pela mesma razão, um Espírito jovem, espiritualmente falando, não podendo chegar à maturidade no curso de uma existência, que é menos que uma hora em relação à vida do Espírito, um corpo adulto pode encerrar um Espírito criança , pelo caráter e pelo desenvolvimento moral." (Revista Espírita. Março de 1868. Flageolet. Allan Kardec)
Sendo assim, por que as religiões de sincretismo religioso Afro-Brasileiro acreditam que exista a linha de corrente dos erês (crianças), que representam um agrupamento de Espíritos de crianças que supostamente realizam trabalhos espirituais?
Segundo Herculano Pires, "As manifestações de espíritos de crianças são naturais, pois todos os espíritos podem manifestar-se. Mas as manifestações desses espíritos em cadeia, formando correntes para trabalhos espirituais não têm sentido. As crianças transformam os médiuns em bebês chorões, pedem chupetas e mamadeiras, querem brincar com bonecas e assim por diante. Acontece que os espíritos de crianças não são crianças, mas adultos. Deixando o corpo infantil são confiados a espíritos superiores que os orientam para que se descondicionem da situação infantil, de que somente necessitavam em função de sua rápida passagem cármica pela Terra. Quando o espírito já dispõe de conhecimentos espirituais, retorna por si mesmo e naturalmente à condição de adulto. A condição infantil corresponde às necessidades evolutivas do corpo material. Cumpridas essas exigências psicobiológicas, retornam à condição de adultos. Isso se torna evidente nas manifestações de espíritos de crianças mortas que se manifestam aos pais para identificar-se, mas em manifestações posteriores já se declaram adultas. Um menino de oito anos, em nosso grupo de trabalho, respondeu aos mimos e preocupações dos pais dizendo:
"Não sou mais criança. A morte nos faz crescer depressa. Fiquei moço em poucos dias. Mas sou o mesmo espírito que vocês só conheceram como criança. Cumpri a minha missão e agora tenho de prosseguir na minha evolução. Estarei sempre com vocês, porque os amo, mas não pensem em mim como morto ou como criança, pois não sou mais nenhuma dessas duas coisas".
Os espíritos de crianças, de adultos, de velhos, manifestam-se como eram na carne para se identificarem, mas não permanecem no estado em que morreram. As manifestações do sincretismo religioso são em geral condicionadas pelas crenças e tradições das religiões (...) dos vários tipos de manifestações religiosas de que provêm. Trata-se em geral de manifestações anímicas submetidas ao processo de condicionamento à crença, pesquisado por Richet no século passado e pelos parapsicólogos atuais. "(Ciência Espírita e suas implicações terapêuticas. Cap. 10. J. Herculano Pires)
A respeito deste assunto, Cairbar Schutel faz o seguinte esclarecimento: " (...) o Mundo Espiritual é provido de meios que fornecem à vida de além-túmulo as condições indispensáveis para a transição. Por exemplo, dizem as entidades do Espaço que lá existem hospitais onde são tratados aqueles que passam por longa enfermidade, e os quais, por suas condições de atraso, não percebem o Mundo dos Espíritos em sua realidade. Aí são curados, e, depois, instruídos sobre a nova situação até que se adaptem ao meio em que se acham.
Os Espíritos dos que morrem quando crianças, são acolhidos carinhosamente por missionários, que se dedicam a essa tarefa, e são igualmente instruídos até que se lhes desponte a consciência integral e desapareça deles o traço infantil gravado na "consciência pessoal". Assim também sucede com a alimentação. Aos entes muito materializados, que chegam ao Mundo Espiritual sem compreenderem a transformação porque passaram, e têm ainda sensação de fome e sede, lhes são ministrados alimentos em instalações especiais, até que, adaptados ao meio em que iniciaram a nova vida, compreendam que não têm mais necessidades desses alimentos, que julgavam precisos para sua manutenção.
Naturalmente, os alimentos assemelham-se muito aos que lhes eram usuais na Terra, mas são feitos de matéria peculiar ao Mundo dos Espíritos e de acordo com o corpo fluídico, ou seja, o organismo perispiritual de cada um." (A vida no outro mundo. Cap. 13. Perturbação da morte. Cairbar Schutel)
No livro "Entre a Terra e o Céu", o Espírito André Luiz descreve uma colônia espiritual, onde algumas crianças são acolhidas, vejamos o seu relato:
"Doce melodia que enorme conjunto de meninos acompanhava, cantando um hino delicado de exaltação do amor materno, vibrava no ar.
Aqui e ali, sob tufos de vegetação verde-clara, muitas senhoras sustentavam lindas crianças nos braços.
- É o Lar da Bênção, - informou o instrutor, satisfeito. - Nesta hora, muitas irmãs da Terra chegam em visita a filhinhos desencarnados. Temos aqui importante colônia educativa, misto de escola de mães e domicílio dos pequeninos que regressam da Esfera carnal.
O Ministro, porém, interrompeu-se, de improviso.
Nossas companheiras pareciam agora tomadas de jubilosa aflição.
Vimo-las desgarrar, de inopino, qual se fossem atraídas por forças irresistíveis, precipitando-se para os anjinhos que cantarolavam alegremente. Enquanto a que nos era menos conhecida enlaçava louro petiz, com infinito contentamento a expressar-se em lágrimas, dona Antonina abraçou um pequeno de formoso semblante, gritando, feliz:
- Marcos! Marcos!...
- Mãezinha! Mãezinha!... - Respondeu a criança, colando-se-lhe ao peito.
Clarêncio fez sinal para as irmãs vigilantes, que se responsabilizavam pelos entretenimentos no parque, como a solicitar-lhes proteção e carinho para as nossas associadas de excursão, e disse-nos, em seguida:
- O pequeno Júlio não se encontra no grupo. Ainda sofre anormalidades que lhe não permitem o convívio com as crianças felizes. Acha-se no lar da irmã Blandina. Rumemos para lá." (Entre a Terra e o Céu. Cap. 9. No Lar da Bênção. Espírito André Luiz. Psicografado por Chico Xavier)
Herculano Pires afirma: "(...)Na obra da Criação, que é sobretudo ordem, amor e justiça, não se pode admitir logicamente esse abandono das crianças espirituais à própria sorte. Os espíritos infantis que não retomam sua maturidade mental logo após a morte são entregues aos espíritos maternais que, segundo técnicas especiais, tratam de protegê-los e levá-los à reintegração em suas experiências de vidas anteriores. O Espiritismo, como dizia Kardec, é uma questão de bom-senso." (Ciência Espírita e suas implicações terapêuticas. Cap. 10. J. Herculano Pires)